Iniciativa
Tempo de pensar na terceira idade
Na quarta Semana Municipal do Idoso, Pelotas quer se tornar uma cidade mais agradável a eles
Jô Folha -
Todos vamos envelhecer. E, se as tendências se confirmarem, a terceira idade será cada vez mais longa - a expectativa de vida para os gaúchos em 2030 beira os 79 anos. Para garantir uma velhice com maior qualidade de vida à população, Pelotas quer se tornar Cidade Amiga do Idoso. O título é conferido pela Organização Mundial da Saúde (OMS) aos municípios que possuem mobilidade urbana acessível, respeitam as pessoas maiores de 60 anos e são consideravelmente seguros. O protocolo de ações do programa será assinado neste sábado (7), último dia da Semana Municipal do Idoso.
No Brasil, apenas Porto Alegre e Veranópolis receberam a classificação. Para auxiliar as cidades a se adequarem ao modelo proposto, a OMS lançou um guia com diversos passos a serem seguidos. Uma das premissas é conversar com os idosos e deixá-los participar do processo. Em Pelotas, pesquisa da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal (Faurb/UFPel) ouve essa população e tenta entender o que ela espera do Poder Público. Adriana Portella, professora responsável pelo estudo, revela que há dois pilares para o município ser mais acessível aos idosos: conscientização da população e readequação do espaço público.
Nesse sentido, a prefeitura traçou algumas políticas públicas que devem ser desenvolvidas a longo prazo e abrangem todas as secretarias. Na área da saúde, o número de equipes de saúde da família com foco no idoso deverá ser ampliado, além da quantidade de equipes itinerantes. De acordo com pesquisa do Programa de Pós-graduação em Epidemiologia (PPGE) da UFPel, a saúde desse grupo de pessoas merece mais atenção. Dados revelam que 66,7% dos pelotenses acima de 60 anos sofrem de hipertensão, 56,3% têm sobrepeso, 40,7% apresentam colesterol alto, 23,5% possuem diabetes e 12,6% ainda fumam.
A falta de atividades físicas é outro ponto crônico retratado no estudo do PPGE: 81,5% dos entrevistados disseram ser inativos neste quesito. Um dos projetos da prefeitura é aumentar o número de grupos do Vida Ativa, iniciativa que leva dança e práticas esportivas aos idosos. A ideia é descentralizar as atividades, levando-as para os bairros, conta Clotilde Vitória, secretária de governo.
Adequar a mobilidade urbana é outro ponto que pode incentivar a prática de exercícios como, por exemplo, caminhadas. Os resultados preliminares da pesquisa comandada por Adriana revelam que pequenos detalhes fazem toda a diferença para quem caminha com dificuldades ou tem medo de levar um tombo. Meios-fios altos, sinaleira com pouco tempo para travessia, poucas faixas de segurança e calçadas estreitas foram alguns dos problemas relatados pelos entrevistados. No guia da OMS, a importância da acessibilidade é ressaltada. Lugares para descansar, calçadas adequadas, cruzamentos seguros e ciclovias são alguns dos itens indicados para uma cidade ser amiga do idoso.
Resgatar e valorizar as memórias das pessoas mais velhas é outra política pública proposta. A ideia surgiu durante a Semana do Patrimônio, comemorada em agosto. Equipes foram aos bairros e reuniram pessoas que possuíam memórias daquele local. Depois, registraram e apresentaram essas lembranças à população. "O projeto foi muito bonito e muito bem aceito", conta Clotilde. A intenção é seguir com o projeto, beneficiando eles e a população, que ganha com aprendizado.
Adriana Portella afirma que para ser uma cidade amiga do idoso é necessário enfatizar a importância deles na cidade. Dentre os problemas enfrentados por eles em Pelotas, destaca a falta de respeito e de empatia dos outros. "Todos nós vamos envelhecer", lembra. O estudo está sendo feito em três bairros de Pelotas: Fragata, Centro e Navegantes. Neste último, o principal problema é a falta de infraestrutura. As calçadas e a pavimentação são péssimas. A maioria das questões poderia ser resolvida com a participação dos moradores, os principais interessados nas mudanças. Segundo a arquiteta, às vezes a prefeitura realiza obras que não são tão esperadas pelos habitantes e deixa de lado outras que poderiam, de fato, fazer a diferença naquela comunidade.
Para Adriana, as áreas verdes existentes em Pelotas, importantes para uma vida com maior qualidade, não são inclusivas. "As praças são planejadas para crianças com todas as aptidões", fala, lembrando que avós com dificuldades de locomoção não conseguem frequentá-las. A OMS sugere que haja bancos, banheiros acessíveis e pisos adequados nesses locais.
Uma cidade mais amigável à sua população faz com que os habitantes queiram se integrar a ela. "Os idosos querem viver muito mais o município", constata Adriana. Com um espaço urbano menos acessível, porém, a pessoa se isola e pode acabar até desenvolvendo doenças psíquicas, lembra a arquiteta e urbanista. Para isso, além de um planejamento urbano adequado, é necessário também pensar na educação e na assistência social.
Socializar para viver bem
Assistência social, aliás, também integra as políticas públicas pensadas pela prefeitura. A ideia é ampliar o número de grupos de convivência ligados aos Centros de Referência de Assistência Social (Cras) ou às igrejas. Outra política, promessa de governo da prefeita Paula Mascarenhas, é a criação de um centro permanente de atendimento aos idosos.
Desde 1990, o Centro de Extensão em Atenção à Terceira Idade (Cetres) da Universidade Católica de Pelotas (UCPel) presta atendimento de socialização a pessoas com mais de 50 anos. São 25 oficinas ministradas por voluntários de segunda a sexta-feira, sempre à tarde. Os cursos têm a intenção de resgatar a autoestima e mantê-los ativos. Dona Maria Antonieta Escarcelo, de 73 anos, é uma das participantes das aulas de dança do ventre e tribal e é exemplo de vitalidade. A distância entre sua casa e o Instituto de Menores Dom Antônio Zattera, cerca de 1,5 km, é percorrida a pé ou de bicicleta. "Não gosto de andar de ônibus", revela. Além das aulas, gosta também do tempo que passa com as colegas.
Participante de todos os cursos de dança, Darli Maria Moreira, 60, frequenta o centro há 13 anos. Aposentou-se cedo, aos 52 anos, devido a problemas de saúde. A ideia de passar os dias em casa, fazendo o serviço doméstico, não combinava com ela. "Quando era jovem, eu fazia de tudo", conta, lembrando do tempo em que estudava, cuidava dos filhos e da casa e trabalhava. O excesso de esforço físico da época em que fazia faxinas para complementar a renda e do trabalho como fisioterapeuta causou-lhe problemas nos braços. Durante o tempo em que estava de licença-saúde, foi acometida por quatro isquemias e precisou parar de trabalhar. A partir daí, passou a dedicar três dias da semana às aulas de dança cigana, tribal, do ventre e de ritmos. No futuro, pretende seguir fazendo o que faz, sempre com alegria. Além do Cetres, participa de grupos de canto.
Viagens são outra forma de lazer bastante procurada pelos maiores de 60 anos. As agências da cidade constatam que grande parte de seus clientes é de aposentados procurando por lazer em municípios da região e até em outros países - a maioria disposta a viajar em grupo e fazer novas amizades.
Recomendações da OMS para uma cidade adaptada aos idosos:
Ambientes limpos e agradáveis; existência de espaços verdes; lugares para descansar; calçadas amigáveis aos idosos; cruzamentos seguros para pedestres; acessibilidade; segurança; calçadas e ciclovias em bom estado; prédios acessíveis com elevadores, rampas, portas e corredores amplos, piso antiderrapante, áreas de estar, sinalização adequada e banheiros públicos com acesso a pessoas deficientes.
Semana do Idoso
A cidade está comemorando a 4ª Semana do Idoso, instituída em 30 de abril de 2014 pela lei municipal 6.111. Ela tem como objetivo levar alternativas de cuidados e lazer aos idosos de Pelotas. Confira a programação dos próximos dois dias:
Sexta-feira
14h - Mercado Central. Aulão de dança Sesc; Grupo de Danças do Círculo Operário Pelotense; show com o cantor Eli Pinheiro.
18h - Lyceu Rio-grandense. Palestras: seminário sobre o Dia do Patrimônio; Residência Integrada Multiprofissional em Saúde do Idoso, Universidade Católica de Pelotas (UCPel).
Sábado
10h - Praça Coronel Pedro Osório. Passeio com encerramento na prefeitura.
11h30min - Salão Nobre da prefeitura. Assinatura do Protocolo de Ações do Programa Cidade Amiga do Idoso.
Das 15h às 18h - Restaurante Popular. Show de Talentos (ingresso um quilo de alimento não perecível ou um litro de leite, a serem destinados à Casa do Idoso).
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